Bozizé: Constituição guineense permite ou não extradição?
2 de maio de 2024Um Tribunal Penal Especial da República Centro Africana lançou um mandado de captura internacional contra o ex-Presidente do país, François Bozizé, exilado em Bissau, desde março de 2023.
O chefe de Estado guineense, Umaro Sissoco Embalo, diz que a Guiné-Bissau não vai extraditar Bozizé e justifica que a lei do país não permite a extradição.
Em declarações à DW, o jurista Roberto Indeque explica que a Constituição guineense só não permite extradição por motivos de perseguição política. E que, se for provado que foram cometidos crimes transnacionais, a legislação permite, sim, que a pessoa seja extraditada.
O jurista diz que não fica bem para a Guiné-Bissau, à luz da comunidade internacional, em termos diplomáticos e políticos, rejeitar sem fundamentos o cumprimento deste mandado de captura internacional.
DW África: A lei da Guiné-Bissau permite ou não a extradição de uma pessoa que está exilada no país?
Roberto Indeque (RI): Podemos admitir que a nossa lei não permite a extradição de qualquer cidadão estrangeiro exilado aqui na Guiné-Bissau, esse é o primeiro ponto. Na segunda perspetiva, podemos analisar em que moldes foi emitido o mandado de captura internacional e em que condições foi pedida a extradição. Se aquela extradição é apenas por motivos políticos, a nossa Constituição é clara: não permite a extradição.
Agora, se a extradição visa os crimes cometidos pela pessoa em causa, os chamados crimes transnacionais, nomeadamente genocídio, tortura massiva, etc. A ser o caso, aí a nossa Constituição já permite a extradição dessa pessoa. Mas a extradição tem de ocorrer por vias ou canais judiciais, isso significa dizer que a entidade que quiser a extradição tem de intimar o nosso Governo e o nosso Governo interpõe um processo junto do Supremo Tribunal para averiguar até que medida essa pessoa deve ser extraditada, que tipo de crime esta pessoa teria cometido no seu país de origem. De acordo com esta conclusão, o nosso tribunal vai decidir se esta pessoa deve ser ou não extraditada.
DW África: Qual é a condição para um político pedir exílio na Guiné-Bissau?
RI: Há duas formas de pedir exílio. A pessoa visada pode requer diretamente às autoridades, invocando os motivos que a levam a pedir exílio e se a nossa autoridade analisar e chegar à conclusão de que efetivamente essa pessoa é vítima de uma perseguição política, pode conceder-lhe um exílio político. Por outro lado, um organismo internacional que vela pelo direitos humanos também pode requer exílio político para uma pessoa que acha que está a ser vítima de uma perseguição política.
DW África: As autoridades podem rogar na legislação do país para defender que não podem entregar a pessoa?
RI: Perfeitamente. À luz do artigo 43. nº 2 da nossa Constituição, de que a nenhum cidadão estrangeiro é permitido a sua extradição por motivos políticos. Se chegar à conclusão de que o pedido de extradição de Bozizé é politico, a nossa Constituição é clara sobre isso. E se for um crime comum, a nossa Constituição não proíbe a extradição, mas remete isso para as instâncias judiciais para averiguar a oportunidade e as circunstâncias de aceitar ou não a extradição de um cidadão estrangeiro.
DW África: Neste caso, a lei guineense previu alguma coisa sobre se um politico pedir exílio e ter o mandado de captura internacional, as autoridades têm o dever ou a obrigação de colaborar e entregar essa pessoa?
RI: Naturalmente que sim, por ser um país membro da comunidade internacionale também um signatário do Tribunal Penal Internacional tem a obrigação efetivamente de colaborar para o bom nome e para o respeito das normas internacionais que o país assumiu voluntariamente, mas antes precisamos de ver os tipo de crimes pelos quais essa pessoa vem sendo indiciada.
Por outro lado, temos de ver em que condições o Bozizé requereu o exílio e em que condições o referido exílio foi aceite.
DW África: Caso as autoridades não cumprirem com a extradição qual é a consequência para país ou qual seria a repercussão deste caso para o país?
RI: As consequências não serão imediatas nem diretas. Elas serão definidas com o tempo. A comunidade internacional pode começar a ver a Guiné-Bissau como um país incumpridor das normas internacionais e das convenções que ele mesmo é signatário. Portanto, não fica bem à luz da comunidade internacional, em termos diplomáticos e políticos, o país rejeitar sem fundamentos o cumprimento deste mandado de captura internacional. Não fica bem.