Governo do Niassa acusado de passar cheques sem cobertura
22 de março de 2022As comunidades de Nungo e Marangira, no distrito de Marrupa, na província moçambicana de Niassa, dizem que receberam cheques sem cobertura no ato das compensações de 20% pela exploração dos recursos naturais nos anos 2020 e 2021, pelas mãos do secretário de Estado Dinis Vilanculos.
A Associação da Rede Provincial de Paralegais para Arbitragem e Desenvolvimento Sustentável Justiça Ambiental pelas Comunidades (REPADES-JAC) no Niassa aponta problemas na canalização dos fundos.
Segundo o diretor da REPADES-JAC, Virgílio Benesse, dois anos depois, o dinheiro ainda não apareceu nas contas das comunidades.
"Normalmente quando se encaminha os cheques para as comunidades é suposto que nas contas pelos quais os cheques são encaminhados possa existir algum fundo para mudar a vida da comunidade para o bem-estar social, ambiental e cultural", disse Benesse, sublinhando que a comunidade ainda não recebeu o dinheiro em causa.
"Ainda não recebemos"
O presidente do Fundo de Desenvolvimento Comunitário de Nungo, Joaquim Vahalaia, lembra-se bem do "cheque gigante" de 174 mil meticais que o secretário de Estado Dinis Vilanculo entregou à comunidade em 2020. No entanto, a população não conseguiu, até hoje, levantar os cerca de 2.500 euros.
"Nós esperávamos que entrasse os valores, depois de dizerem que já temos o valor no banco. Fomos consultar o saldo no banco e constatamos que não entrou nada, tiramos extrato e continuaram a dizer que o valor é anterior e que já tínhamos recebido o dinheiro nas transferências anteriores. Até hoje não recebemos", afirma Joaquim Vahalaia.
Contactado pela DW, o secretário de Estado do Niassa Dinis Vilanculo não aceitou gravar a entrevista, mas afirmou que a entrega dos cheques gigantes foi um mero "ato simbólico". O dinheiro, garantiu, já tinha sido transferido para as contas das comunidades mesmo antes das cerimónias.
Pagamento é feito através da transferência
O chefe de departamento de Fauna Bravia no serviço provincial de Ambiente no Niassa confirma que "em nenhum momento é emitido algum cheque". Segundo Fernando Lembane, a Administração Nacional de Áreas de Conservação comunica ao Ministério das Finanças o valor pago pelos operadores no terreno e o dinheiro é transferido dos cofres do Estado para as associações ou comunidades das áreas de exploração dos recursos naturais.
"Quem canaliza os 20% não são os serviços provincial de Ambiente, é o próprio Estado através de colheita dos 20% na base da senha que os operadores pagam à administração nacional das áreas de conservação", explicou à DW Fernando Lembane, que esclareceu ainda que o pagamento não é feito através de cheques, mas a partir de transferências bancárias.
"A ANAC envia às finanças em relação as senhas pagas e os valores depositados nos cofres e dali as Finanças retiram os 20% e canalizam para as associações ou comunidades de gestão de recursos naturais. Logo, em nenhum momento é emitido algum cheque, o que é feito é a transferência para as contas da comunidades e feita a entrega de cheques gigantes simbólicos", esclareceu o chefe de departamento de Fauna Bravia no serviço provincial de Ambiente no Niassa.
As comunidades de Nungo e Marangira, no entanto, nunca viram esse dinheiro - além do ato simbólico. O secretário de Estado Dinis Vilanculos rejeita responsabilidades, apontando questões de desentendimento interno como possível explicação. Sem avançar detalhes, o responsável afirma que existem casos em que as transferências são feitas e os líderes comunitários se apropriam do dinheiro em benefício próprio.