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Egito: Nova lei de asilo pode afetar direitos de refugiados

Jennifer Holleis
25 de novembro de 2024

Refugiados do Sudão, Síria e Gaza terão pela frente novas condições para permanecerem no Egito. Irá a nova lei de asilo do Cairo agilizar os procedimentos à custa dos direitos humanos?

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Palestinianos deslocados em Rafah, perto da fronteira da Faixa de Gaza com o Egito
A nova lei de asilo vai transferir da ONU para as autoridades egípcias a responsabilidade pelos refugiadosFoto: MAHMUD HAMS/AFP via Getty Images

O Egito está a apenas um passo de ratificar uma nova lei sobre requerentes de asilo que passará a responsabilidade da Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) para o Governo do Cairo.

Assim que entrar em vigor, o Egito terá o seu próprio quadro jurídico para lidar com o crescente número de refugiados no país e decidir se um pedido de asilo é aprovado ou rejeitado.

Com o Governo a planear implementar a lei o mais rapidamente possível, o mais provável é que o Presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, dê a sua aprovação final ao projeto de lei sobre a "regulamentação do asilo de estrangeiros no Egito" nos próximos dias.

O Governo egípcio anunciou este mês que o número de refugiados do Sudão, Síria, Sudão do Sul, Iémen, Eritreia e Gaza atingiu os 9 milhões.

No entanto, até outubro, apenas cerca de 800 mil estavam registados no ACNUR, tendo assim direito a apoios e acesso a cuidados de saúde e educação.

Desde abril de 2023, o número de refugiados sudaneses registados no Egito junto do ACNUR quintuplicou, atingindo os 300 mil
Desde abril de 2023, o número de refugiados sudaneses registados no Egito junto do ACNUR quintuplicou, atingindo os 300 milFoto: Khaled Elfiqi/picture alliance

A grande maioria vive no Egito sem estatuto oficial de refugiados e depende das suas próprias poupanças, ajuda comunitária, familiares, voluntários ou donativos.

"A nova lei de asilo transfere para o Egito a propriedade do processo de migração e a sua vertente operacional", explica Kelly Petillo, investigadora do Médio Oriente no Conselho Europeu de Relações Internacionais, em entrevista à DW. "A decisão tem sido vista de forma bastante negativa, com os grupos de defesa dos direitos humanos a encará-la como uma retirada de propriedade à ONU e às organizações de defesa dos direitos humanos", acrescenta.

Há muito que observadores e ativistas criticam o historial de violações dos direitos humano no Egito, que foi exacerbado pela guerra em Gaza. O papel do Cairo na crise do Médio Oriente deixou diplomatas e representantes estrangeiros relutantes em expressar críticas por receio de perderem um parceiro estratégico.

Mustafa Madbouly, primeiro-ministro do Egito
Mustafa Madbouly, o primeiro-ministro do Egito, vai dirigir a nova comissão de asiloFoto: SOPA Images/picture alliance

Sem proteção essencial

Para as autoridades egípcias, no entanto, a nova lei de 39 artigos "visa providenciar um quadro jurídico completo abrangente para os refugiados, garantindo, ao mesmo tempo, um equilíbrio delicado entre os direitos dos refugiados e os deveres nacionais", segundo um comunicado do Governo.

Uma vez em vigor, todas as questões relativas a refugiados e asilo serão decididas pela recém-criada Comissão Permanente para os Assuntos dos Refugiados, sob a liderança do primeiro-ministro egípcio, Mustafa Madbouly.

O projeto de lei estabelece que a garantia e renovação do estatuto de refugiado passará a depender de três questões essenciais.

Primeiro, refugiados e requerentes de asilo terão de "respeitar os valores e tradições do Egito".

Segundo, estão proibidos de fazer qualquer coisa que possa ameaçar a segurança nacional ou a ordem pública ou contrariar os objetivos e princípios das Nações Unidas, União Africana, Liga Árabe ou qualquer organização de que o Egito seja membro, ou cometer qualquer ato hostil contra o seu país de origem ou qualquer ouro país.

Em maio, oficialmente, cerca de 100 mil palestinianos tinham atravessado a fronteira para o Egito, mas ativistas dizem que o número é mais elevado
Em maio, oficialmente, cerca de 100 mil palestinianos tinham atravessado a fronteira para o Egito, mas ativistas dizem que o número é mais elevadoFoto: MOHAMMED ABED/AFP via Getty Images

Em terceiro lugar, estão proibidos de exercer qualquer atividade política ou partidária, ou qualquer trabalho no âmbito de sindicatos, incluindo fundar, aderir ou participar de qualquer forma em qualquer partido político.

Quem não obedecer a estas regras ou a quem for negado o estatuto de refugiado, deve abandonar o Egito independentemente da situação de segurança no seu país de origem.

Críticas de dentro e de fora

Estas condições preocupam Mona, uma sudanesa de Cartum que fugiu para o Egito quando a guerra civil eclodiu no seu país, em abril de 2023.

"Para muitos membros da sociedade civil sudanesa e grupos de resistência juvenil, o Cairo tornou-se a nossa base, e pergunto-me se isto poderá ser visto como algo que vai contra os valores e as tradições egípcias", afirma, em entrevista à DW, sob condição de anonimato, temendo represálias.

Timothy E. Kaldas, vice-diretos do Instituto Tahrir para as Políticas do Médio Oriente, com sede em Washington, também considera que a nova lei de asilo contém uma série de medidas preocupantes e omite várias proteções essenciais [necessárias] para estar em conformidade com o direito internacional".

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"A importância de garantias para que os requerentes de asilo não possam ser forçados a voltar aos seus países de origem, quando não é seguro fazê-lo, é uma proteção fundamental garantida pelo direito internacional", explica à DW, acrescentando que "esta lei não garante, de forma alguma, essa proteção e esse direito".

Esta semana, 22 organizações de direitos humanos egípcias e internacionais rejeitaram o projet de lei num comunicado conjunto.

"Devido à natureza excessivamente ampla e vaga da expressão 'segurança nacional', esta cláusula de exclusão pode ser usada para restringir excessivamente os direitos dos refugiados sem qualquer controlo real ou recurso legal", lê-se no documento.

A questão dos deslocados palestinianos

Devido à guerra em Gaza, que faz fronteira com o Egito, o Presidente Fatta al-Sisi tem afirmado repetidamente que o seu país não irá acolher um grande número de palestinianos deslocados.

"O risco está agora a aumentar devido à próxima administração [do Presidente eleito Donald] Trump", afirma Kelly Petillo.

No Egito, nem o ACNUR nem a Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos (UNRWA) têm um mandato direto para os refugiados palestinianos. Em determinadas circunstâncias, refugiados palestinianos no Egito podem receber proteção mínima ou apoios sob o mandato mais vasto do ACNUR.

"O Egito quer maior propriedade na questão do asilo, especialmente no caso dos refugiados palestinianos, uma vez que se trata de uma questão politicamente muito relevante e à qual o público egípcio está muito recetivo", diz Petillo.

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Já Kaldas vê outra razão para o Egito insistir na sua própria lei de asilo: "A lei também foi aprovada a pedido dos parceiros europeus do Egito, que pretendem aprofundar o papel do Egito como país de acolhimento".

O Egito tornou-se não só um destino de refugiados regionais, como também um dos parceiros da Europa nos esforços de travar a migração.

O acordo União Europeia-Tunísia, de 2023, que procurava limitar o número de migrantes que chegam a solo europeu com um pacote substancial de ajuda à Tunísia em troca do combate à migração, poderia servir de modelo.

Em março de 2024, a União Europeia (UE) estabeleceu uma "parceria estratégica e global" com o Egito no valor de 7,4 milhões de euros para reforçar a estabilidade do país e intensificar os esforços de luta contra a migração.

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