Festival Berlinda apresenta filme sobre ex-combatentes da Guiné
Nesta quinta-feira, a jornalista e realizadora portuguesa Diana Andringa esteve na capital alemã, Berlim, para a apresentação do documentário "As duas faces da guerra" (2007) no Festival Berlinda de Cultura e Língua Portuguesa. O filme foi feito em parceria com o diretor guineense Flora Gomes. O filme une depoimentos de ex-combatentes portugueses e guineenses para contar a história da luta pela libertação da Guiné. Em 100 minutos, a produção oferece, por um lado, a versão de ex-combatentes portugueses e, por outro, a de ex-combatentes guineenses.
"Mas apesar desse confronto sempre existiu, quer dos guineenses quer dos portugueses alguma cumplicidade. Porque o grande dirigente guineense Amílcar Cabral dizia sempre que 'nós não lutamos contra o povo português, mas sim contra o colonialismo. O povo português é nosso aliado na luta contra o fascismo e o colonialismo'. Isto foi algo que esteve sempre muito presente na mente do PAIGC e de alguma forma fez os portugueses compreenderem a guerra na Guiné, que Portugal perdeu militarmente e que a política portuguesa não tinha razão de ser...não era correcta", diz Diana Andringa.
Interesse antigo
A realizadora portuguesa conta que sempre teve interesse pela história das lutas de libertação em África. A decisão de fazer este filme foi marcada por coincidências. Tudo começou quando ela rodava um documentário sobre a vida de Flora Gomes e se deparou com um quartel português abandonado e relembra: "quando cheguei ao quartel vi uma pedra com nomes de soldados. Imediatamente se percebe que são nomes de pessoas que morreram ali. Dois deles morreram no dia em que completei 20 anos de idade. Aquilo me impressionou. Escrevi um texto sobre isso num jornal onde dizia que alguns nomes não estavam completos....e dias depois recebo uma carta de um senhor que me dizia 'posso dizer-lhe os nomes de todos eles porque eu fazia parte dessa companhia. E disse, não, tenho mesmo que fazer um filme sobre isto."
Duas vitórias
Portugueses e guineenses se enfrentaram por mais de uma década, de 1963 a 1974. O resultado dessa guerra, aos olhos de Andringa, tem aspectos positivos que são enfatizados no filme. Como o facto de ter sido a Guiné que o berço do grupo de capitães que preparou o 25 de abril de 1974, em Portugal, [a Revolução dos Cravos]. Portanto é uma guerra que conduz a duas vitórias: a independência da Guiné e a democracia em Portugal."
O documentário é baseado em depoimentos de pessoas que viveram a guerra e chega a Berlim depois de ter sido exibido em diversas parte do mundo, incluindo Cabo Verde, Portugal e Guiné-Bissau, onde foi rodado. E foi exatamente na Guiné-Bissau, país palco do conflito, onde a apresentação do filme gerou uma comoção da platéia.
"Numa sala onde estavam militares portugueses que tinham feito a guerra na Guiné e militares do PAIGC, que tinham feito a luta de libertação, [eles] choraram, abraçaram-se, falaram e contaram estórias."
África positiva
Para a jornalista e realizadora portuguesa, Diana Andringa, o documentário 'As duas faces da Guerra' oferece uma outra contribuição importante para a Guiné-Bissau, que vai além do simples registo da história do país. "A imagem que se dá de África é sempre de países corruptos, com imensos problemas. Sempre uma imagem negativa. É preciso dizer-lhes que também há uma imagem positiva. Os africanos tiveram grandes dirigentes. A luta pela independência da Guiné foi uma luta muito bonita. Provavelmente a Guiné-Buissau seria hoje um país totalmente diferente se Amílcar Cabral não tivesse sido morto. Mesmo quando a história não é para nos orgulharmos é preciso conhecê-la para não cometermos os mesmo erros", completa Diana Andringa.
Autora: Cristiane Vieira Teixeira (Berlim)
Edição: Carla Fernandes / António Rocha