Forças Armadas guineenses celebram 60 anos sob críticas
15 de novembro de 2024A Guiné-Bissau é conhecida pela sua crónica instabilidade política e governança que, em algumas ocasiões, provocou a intervenção militar e golpes de Estado. Há pouco mais de duas décadas, o país viveu uma guerra civil em que as alas do exército entraram em conflito, com divergências políticas no meio.
E numa altura em que se celebram os 60 anos das Forças Armadas da Guiné-Bissau, o país está, mais uma vez, envolvido numa profunda crise política, há cerca de um ano, em que os militares têm seu papel questionado.
Insatisfação popular
Ao analisar o papel do Exército no processo democrático e no desenvolvimento do país, os cidadãos ouvidos pela DW em Bissau reprovam o comportamento dos militares.
"As forças armadas não devem constituir uma ameaça ao povo. Nós devemos ter a confiança e a garantia das nossas forças armadas para exigir os nossos direitos", disse à DW um funcionário público guineense.
"As forças armadas têm faltado com seus deveres. Por isso, não posso dizer que o balanço dos 60 anos é positivo", afirmou um estudante.
"Podemos falar de forças armadas que não estão a atuar de acordo com a vontade do povo, porque elas existem exatamente para garantir a segurança, mas, sobretudo, para que o povo possa exercer os seus direitos livre e tranquilamente".
Envolvimento político
O jurista e investigador do Instituto da Defesa Nacional, Augusto Nansambé, considera justas as críticas feitas às forças armadas.
"Porque vimos que, nos últimos anos, as forças armadas, em vez de tomar uma posição apartidária e equidistante das querelas políticas, parecem apadrinhar lutas e problemáticas que envolvem os políticos, realizando conferências de imprensa e respondendo a algumas formações políticas", relata.
Celebrar em grande
As Forças Armadas Revolucionárias do Povo (FARP) foram criadas nas matas de Cassacá, no sul da Guiné-Bissau, em plena luta de libertação para a independência.
Este sábado (16.11), as FARP completam 60 anos. Para a comemoração do aniversário, as autoridades projetam a realização de várias atividades, em Bissau, com a presença de diversos convidados estrangeiros.
Mas o líder do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Domingos Simões Pereira, critica a pompa com que o evento está a ser realizado.
"Não é possível, numa altura em que temos gente a morrer porque não têm soro no hospital, estarmos a gastar milhões que foram pedidos [ao estrangeiro] em nome da Guiné-Bissau e do centenário de Amílcar Cabral, numa festa que não vai unir o povo guineense", dispara.
Acima da lei
Na passada terça-feira (12.11), o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, Biaguê Na N'tan, ameaçou retaliar quaisquer manifestações de rua por parte de políticos que ponham em causa a celebração do dia dos militares guineenses.
O jurista e investigador do Instituto da Defesa Nacional, Augusto Nansambé, critica o facto de as forças armadas estarem a ser dirigidas por Na N'tan, de 74 anos, e defende o rejuvenescimento do Exército.
"Porque o próprio Estatuto Militar e a LOBOFA (Lei de Base da Organização das Forças Armadas) dizem claramente que o chefe de Estado-Maior tem que ter a idade máxima de 64 anos. Atualmente, temos Forças Armadas de Combatentes da Liberdade da Pátria e da Guerrilha, mas tem de haver um rejuvenescimento da classe castrense", argumenta.
Para reformar e modernizar as forças armadas, Augusto Nansambé defende que haja um poder político democrático e eleito, que seja capaz de juntar as sinergias para atingir esse objetivo que reconhece não ser fácil.