Condenação do ex-edil David Simango gera desconfiança
10 de junho de 2021Um tribunal de Maputo condenou na quarta-feira, 9 de junho, o ex-presidente do município de Maputo,David Simango, a uma pena de prisão convertida em multa. O caso remonta a 2013, quando a sua mulher recebeu um apartamento num prédio em construção, como contrapartida pela intervenção do autarca a favor da sociedade Epsilon Investimentos no respetivo processo de construção.
David Simango, membro da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO, no poder), foi acusado dos crimes de "aceitação de oferecimento ou promessa e abuso de cargo e função". Acabou condenado a uma pena de 18 meses de prisão e 15 meses de multa - sendo que a pena de prisão foi também convertida em multa.
A DW África falou com Edson Cortez, diretor do Centro de Integridade Pública (CIP) de Moçambique, para perceber se a condenação de uma figura pública ligada ao poder representa uma mudança de atitude da Justiça moçambicana.
DW África: Poderia ajudar-nos a "contextualizar" este caso? Como foi possível esta condenação de uma destacada figura política, ligada ao poder?
Edson Cortez (EC): Os factos do crime ocorreram à luz do antigo Código Penal. E, neste momento, Moçambique tem um novo Código Penal. Um crime da natureza daquele que foi cometido pelo antigo presidente do município de Maputo poderia ser convertido no pagamento de uma multa, não [sendo necessário] cumprir a pena [de prisão] de um ano como foi preconizado pelo juiz. No âmbito do novo Código Penal já teria efeitos de prisão efetiva. O juiz manda um recado à sociedade de que a corrupção eventualmente funciona. Porque, depois de ter usufruído do apartamento e ter ganho rendas durante um bom par de anos, o edil da cidade de Maputo não foi preso, e, na opinião pública, o efeito é de que o crime compensa e que a corrupção de colarinho branco nunca será penalizada no nosso país. Porque a razão comum obviamente não compreende as tecnicidades legais que levaram a que a pena atribuída ao senhor David Simango tenha sido essa.
DW África: No entanto, aquando da condenação do edil de Nampula, Paulo Vahanle, muitos criticaram que a decisão da Justiça foi política, alegando que só são condenáveis membros da oposição. Será que esta condenação é o prenúncio de uma mudança de postura da Justiça em relação à Frelimo?
EC: Não, não creio. Não tem nada a ver com uma mudança de postura. O caso das dívidas ocultas é um exemplo, e há muitos outros escândalos de corrupção envolvendo figuras do partido FRELIMO. Há muita gente que não é investigada, porque o poder político exerce bastante pressão sobre o poder judicial, não havendo espaço para que este seja independente.
DW África: Portanto, é de opinião que não foi feita justiça completa visto que a pena do antigo edil de Maputo foi convertida em multa. Ainda faltará levar a tribunal algumas altas figuras ligadas à "teia", inclusive os próprios corruptores?
EC: De facto, onde há corrupção, há corruptores. Era importante saber qual foi o papel desempenhado por essas segundas ou terceiras partes desse esquema e se essas pessoas serão penalizadas pela sua participação neste crime.