60 grupos armados negoceiam paz na RDC em Nairobi
30 de novembro de 2022Cerca de 230 participantes, incluindo representantes da sociedade civil e quase 60 grupos armados, iniciaram, esta quarta-feira (30.11), em Nairobi, a terceira ronda de conversações com o Governo da República Democrática do Congo (RDC) para alcançar a paz no leste do país.
"Viemos aqui para definir uma forma de trabalhar em conjunto para alcançar a paz. Sabemos que algumas pessoas no Congo estão sem paz há mais de 20 anos", disse o ex-presidente queniano Uhuru Kenyatta, mediador da Comunidade da África Oriental (EAC), o bloco regional de sete nações que acolhe o diálogo.
Numa conferência de imprensa de abertura das conversações, Serge Thisbangu, enviado especial do processo para substituir o Presidente da RDC, Félix Tshisekedi, que não está presente, celebrou o facto de "mais de 80% dos grupos armados terem mantido até agora o cessar-fogo" que acordaram em abril passado, quando a capital queniana acolheu a primeira ronda de conversações.
O grande ausente das conversações é o Movimento 23 de Março (M23), que foi excluído do diálogo depois de ter sido acusado pelo executivo congolês de lançar ataques dias após o início da primeira ronda de conversações em abril. O Movimento também não respeitou o cessar-fogo, saído da mini-cimeira de Luanda, e que deveria ter entrado em vigor na semana passada.
ONG deixa alerta
Num comunicado, publicado esta quarta-feira (30.11), o Internacional Crisis Group, recomenda que Nairobi poderia "usar a sua influência junto do Presidente Tshisekedi para o exortar a abandonar a sua retórica inflamatória dirigida a Kigali".
Paralelamente, a mediação queniana liderada pelo ex-Presidente Uhuru Kenyatta - sob os auspícios da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos - "deve continuar a instar o Ruanda a controlar o M23", cujo apoio permite ao movimento cercar atualmente a cidade de Goma, capital do Kivu do Norte, e em relação ao qual "Kigali detém uma influência considerável sobre a sua liderança", afirma a organização não-governamental baseada em Nova Iorque e em Bruxelas.
O instituto sugere que a mediação deve "encorajar" o Presidente da RDCongo, Felix Tshisekedi, a continuar as recentes reuniões conciliatórias com as minorias de língua tutsi e kinyarwanda do Kivu do Norte, "que se encontram sob pressão porque alguns congoleses do leste os veem como apoiantes do M23", assim como pode "também levantar a questão da Frente de Libertação Nacional do Ruanda (FDLR), exortando o Presidente congolês a reprimir a colaboração entre esta e o exército nacional" congolês.
Quanto ao Ruanda, Nairobi "deve deixar claro a Kigali que o não compromisso pode prejudicar a sua posição no seio da Comunidade da África Oriental (EAC), e possivelmente levar a um revés diplomático em relação aos seus principais parceiros ocidentais, os Estados Unidos, o Reino Unido e a França".
Conversações são a "melhor via disponível"
Se o M23 aceitar um cessar-fogo e se retirar das posições recentemente tomadas em torno de Goma, "Kinshasa deveria considerar a possibilidade de suavizar a oposição" à participação do grupo rebelde nas conversações de Nairobi, que o ICG considera ser "a melhor via disponível" para a RDCongo abordar as suas queixas.
"Será importante que os diplomatas regionais sublinhem a necessidade de tais compromissos recíprocos para quebrar os ciclos de recriminação que estão na base da violência na região", escreve o ICG.
O desafio criado pela reativação do M23 em 2021 tornou-se numa "crise humanitária e de segurança de pleno direito", afirma o instituto, que recorda os números das Nações Unidas, que contabilizaram mais de 180.000 pessoas deslocadas na região do Kivu do Norte apenas no último mês.
Mas as possíveis ramificações da atual violência "vão além do Kivu do Norte" e "arriscam-se a arrastar vários países regionais" para o patrocínio prolongado de "assassinatos por procuração", nomeadamente RDCongo e Ruanda, mas também Uganda e Burundi, alerta o comunicado.
"A doze meses de eleições cruciais na RDCongo, é vital avançar na via diplomática para travar o avanço do M23, que atualmente está a agitar outros grupos armados e a levar a combates que, para além do sofrimento que implicam, podem tornar o próximo recenseamento eleitoral quase impossível e prejudicar a credibilidade do voto", acrescenta o ICG.
O leste da RDCongo é palco de conflitos há mais de duas décadas, alimentados por cerca de 120 milícias rebeldes e pelo exército do país, não obstante a presença da missão de manutenção da paz das Nações Unidas - MONUSCO.