Ruas de Berlim vão ter nomes da resistência africana
20 de abril de 2018Três nomes de ruas na capital da Alemanha, Berlim, vão ser renomeadas, após anos de disputas, para homenagear figuras históricas africanas. A decisão foi tomada esta quinta-feira (19.04) pela assembleia distrital do "bairro africano" de Berlim, que há anos era alvo de críticas de ativistas africanos.
Lüderitzstrasse, Nachtigallplatz e Petersalle são ruas que homenageiam nomes da era colonial da Alemanha. Entre estas figuras está Carl Peters, um dos fundadores da África Oriental Alemã, uma ex-colónia que incluía a atual Tanzânia.
Também Adolf Lüderitz, fundador do Sudoeste Africano Alemão, atual Namíbia, e o explorador Gustav Nachtigall, que esteve presente em várias regiões de África no período colonial, dão nomes às ruas do bairro.
Vários anos de discussões depois, a maioria da assembleia distrital de Berlin-Mitte votou a favor de novos nomes, na noite desta quinta-feira.
Uma decisão "óbvia" para a ativista afro-germânica Josephine Apraku: "Os nomes das ruas, de acordo com a legislação em Berlim, são homenagens. Portanto, não é uma questão de saber se podemos manter os nomes ou não. Se há homenagem, a resposta é óbvia: não podemos".
Colonizadores dão lugar a resistentes
A rua Lüderitz deverá passar a ser Cornelius Frederiks, um líder da resistência do povo Nama, na antiga colónia alemã onde hoje é a Namíbia.
A Praça Nachtigall deverá tornar-se Bell-Platz, em memória de Rudolf Doula Manga Bell, rei da região que é hoje Camarões, que também se rebelou contra a colonização. Já a Avenida de Peters deverá dar lugar a dois nomes em perímetros diferentes: Anna Mungunda, membro dos Herero e primeira mulher da Namíbia a apoiar a independência, e Maji Maji, uma rebelião contra o domínio alemão na atual Tanzânia.
Há anos que os ativistas pedem a renomeação das três ruas. "Somos críticos dessa história e uma reversão de perspetiva é uma ótima maneira de fazer isso", diz Josephine Apraku.
Noutras situações, argumenta, a mudança não seria questionada: "Não teríamos tais discussões se houvesse uma rua Adolf Hitler, já que ninguém iria querer manter este nome. Não quero comparar Carl Peters com Adolf Hitler, mas é bom lembrar que Carl Peters foi percebido pelos nacional-socialistas como um líder de pensamento em relação às ideologias racistas".
"Alguns nomes de ruas no ‘bairro africano' ainda glorificam o colonialismo alemão e os seus crimes, o que é incompatível com a nossa compreensão da democracia e prejudica permanentemente a imagem da cidade de Berlim", dizem os partidos da assembleia distrital. E Apraku está satisfeita: "Para ser honesta, não esperava que as ruas fossem renomeadas ainda no meu tempo".
Moradores divididos
Nas ruas de Wedding, a região conhecida como "bairro africano", nem todos estão de acordo com as mudanças anunciadas. Na Nachtigallplatz – futura Bell-Platz – um jovem saúda a decisão, afirmando que "os criminosos devem desaparecer das ruas". Ao seu lado, um outro morador murmura "isso é uma piada. Deveriam ter pensado mais cedo nisso, os nomes tornaram-se comuns".
"Mudámo-nos para cá há um mês, registámos tudo e agora temos de começar o teatro todo outra vez. Nem me lembro do nome novo", lamenta outra moradora.
O ambiente no bairro não é bom, diz Karina Filusch, porta-voz da Pro Afrikanisches Viertel (em português, Pró-Bairro Africano), uma associação que luta contra a renomeação das ruas. Filusch diz que o processo não foi transparente e "deve ser colocado nas mãos dos cidadãos".
"A boa política é a que traz interesses diferentes ao equilíbrio, o que não aconteceu aqui. A decisão deve ser devolvida aos cidadãos, para que os interessados possam debater a questão", defende a ativista.