Escola Superior de Artes (e Cinema) de Hamburgo é aberta à experimentação
24 de julho de 2014Dos aproximadamente 1200 alunos que se candidatam por ano à Escola Superior de Artes (conhecida por HfbK, iniciais do nome em alemão) menos de 100 conseguem uma vaga. A concorrência é altíssima, já que a Escola Superior de Artes de Hamburgo é uma instituição de ensino conhecida em todo o país como um espaço de inovação.
Em declaração à emissora NDR, seu presidente afirmou há pouco tempo, por exemplo, que "o questionamento de normas e valores da sociedade, bem como a quebra de tabus, fazem parte da essência do artista". E essa é a filosofia da Escola.
Não por acaso saíram da HfbK nomes consagrados do mundo da arte na Alemanha, muitos deles com trajetórias marcadas exatamente por seus comportamentos de contestação e rompimento com modelos pré-estabelecidos. A escola oferece ao aluno a possibilidade de se especializar em cinema, artes gráficas/fotografia, escultura, cenografia, design, pintura/desenho, teoria/história da arte ou mídia contemporâneas.
Se o grande ícone quando se fala em cinema na HfbK é Fatih Akin, filho de pais turcos crescido em Hamburgo e autor de obras contundentes do cinema alemão nos últimos anos (Contra a Parede, Soul Kitchen, Do Outro Lado), passaram também pela Escola artistas plásticos como Martin Kieppenberger, Jonathan Meese, Isa Genzken, Daniel Richter, Santiago Sierra e Rebbecca Horn.
Sem currículo rígido nem conteúdos obrigatórios
Enquanto outras instituições de ensino de cinema primam pela segmentação, a filosofia da HfbK é abrir o leque para o aluno. Ali não há obrigação de seguir um currículo rígido nem de respeitar uma grade pré-concebida de conteúdos. Professores e alunos se veem acima de tudo como partes atuantes num centro de pensamento, que impulsiona debates socialmente relevantes e lança discussões no espaço público quando estas se fazem necessárias.
Na HfbK é possível cursar tanto a graduação em Artes Plásticas, com duração de quatro anos, quanto pós-graduações (mestrado, a ser concluído em dois anos, e doutorado). Para os que se enveredam pela sétima arte dentro do curso, a prioridade é o cinema de arte e de autor, com incentivo especial a obras de caráter experimental, sem esquecer o papel político do cinema neste contexto.
Segundo o próprio site da Escola, a ideia da graduação "não está na institucionalização de quadros de profissões clássicas como direção, roteiro ou fotografia, mas na criação de trabalhos artísticos que devam sua força à capacidade de inovação autônoma e criativa e não se esgotem na aplicação de tecnologias e conhecimentos estabelecidos".
Liberdade intelectual longe das amarras do mercado
Oferecendo aulas teóricas que priorizam a tradição do cinema de autor, a HfbK abre espaço tanto para a ficção quanto para o documentário e a animação – sempre ressaltando que não tem em vista, em primeira linha, somente formar uma mão de obra qualificada para a indústria cinematográfica do futuro. Ou seja, pelo menos na proposta, a HfbK é uma das raras ilhas de liberdade intelectual num universo acadêmico cada vez mais programado para suprir as demandas do mercado. Entre os atuais professores de cinema da Escola estão os conhecidos diretores Wim Wenders, Angela Schanelec e Pepe Danquart. E o célebre ex-aluno da Escola, Fatih Akin, também já deu aulas ali entre 2005 e 2006.
"As outras escolas de cinema normalmente preparam seus alunos para a indústria do cinema e da televisão. Aqui você tem por meta se libertar disso, dando a si mesmo e ao entorno cultural a possibilidade de se surpreender e de possivelmente encontrar algo novo. Assim é possível chegar a resultados no cinema que fogem do convencional e que não cabem em categorias determinadas", afirma o professor Udo Engel à DW Brasil.
Outra opção dentro das artes visuais é estudar "mídias contemporâneas (oferecida tanto na graduação quanto no mestrado) – uma vertente acadêmica com aulas de história da arte, estética e estudos de gênero, por exemplo, ao lado de uma formação prática com oficinas de novas mídias e diversos laboratórios. Sobretudo no mestrado, a proposta é a criação de novos formatos de crossmedia, que misturam as formas tradicionais vídeo, cinema, fotografia, artemídia, arte em rede, games etc.
Prédio lendário
Se a Escola de Manufaturas, que mais tarde daria origem à HfbK, foi fundada já em 1767, foi em 1913 que o atual prédio principal da Escola na rua Am Lerchenfeld, bairro Uhlenhorst, acabou sendo construído, selando a criação da então Escola de Artes. Em 2013, a HfbK celebrou, portanto, seu centenário.
Na calçada que fica em frente ao prédio principal da Escola, duas "lápides do tropeço" lembram dois ex-docentes perseguidos e assassinados durante o nazismo por não serem coniventes com o regime: o arquiteto e ceramista Friedrich Adler, que deu aulas na escola até 1933, tendo sido assinado em 1942 em Auschwitz, e Hugo Meier-Thur, professor de artes gráficas e tipografia de 1910 a 1943, ano em que foi morto no campo de concentração de Fühlsbüttel.