Governo alemão quer restringir cirurgia plástica
26 de abril de 2005A cirurgia plástica na Alemanha está na fronteira entre as barreiras impostas pela ética e o liberalismo exacerbado. Foi isso, pelo menos, o que deixou claro a ministra da Saúde, Ulla Schmidt, na semana passada, ao falar a respeito da atividade que viu o seu faturamento aumentar sete vezes em 15 anos no país.
"É claro que as pessoas podem decidir se querem mudar algo em seu visual. Não há nada de errado em usar maquiagem, jóias, tingir o cabelo, fazer exercícios físicos para tornear os músculos ou uma dieta que não agrida o corpo. Mas quando isso vai para o lado da cirurgia plástica, nós lidamos com uma questão ética", afirmou.
O problema, na opinião da ministra, é a discrepância entre o que ela entende por pessoas doentes que precisam passar por cirurgias para recuperar a saúde e pessoas saudáveis que arriscam sua saúde em nome do "corpo perfeito".
Mudando o anúncio
Na tentativa de frear o crescimento deste mercado, o Ministério da Saúde elaborou um projeto de lei que, se aprovado pelo Parlamento, mudaria a maneira pela qual as clínicas de cirurgia e os médicos especialistas seriam obrigados a alertar os pacientes a respeito dos riscos da operação. A principal mudança seria a substituição das famosas fotos "antes e depois" por informações a respeito do que é ou não recomendável.
Sybille Golkowski, porta-voz da Associação dos Médicos de Berlim, concorda com as restrições aos anúncios apelativos, mas disse que a proposta do governo teria um impacto mínimo.
"É apenas um pequena peça do mosaico. O que nós estamos discutindo é se podemos reverter este comércio. Precisamos fazer com que a mídia pare de divulgar isso", argumentou.
História antiga
Embora a cirurgia plástica estética seja algo relativamente novo dentro da medicina, a vontade de "variar" o corpo é tema que está em pauta há séculos. No século 17, um colete definia e deformava o corpo das mulheres européias.
A tendência a adaptar o corpo a certos padrões de beleza persiste até hoje como parte do comportamento humano. O fato é que existe realmente um claro interesse – particularmente por parte das mulheres – em melhorar a aparência. E se isso significar até incisões cirúrgicas, o assunto esbarra nos limites da ética? As opiniões estão divididas.
Heiner Kirchkamp, que administra uma fundação de aconselhamento aos pacientes interessados em cirurgias plásticas, acredita que a opinião de Ulla Schmidt está errada.
"Não é função do governo nos proteger contra um desenvolvimento social ou dizer aos pacientes o que eles podem ou não fazer", afirma. "Os políticos deveriam manter suas atenções focadas no comportamento de médicos que atuam sem graduação suficiente", acrescenta.
Ele reclama que o veto às fotos "antes e depois" se restringiria ao fluxo da informação, mas não impediria as pessoas interessadas de buscar as cirurgias plásticas.
"Eu vi casos onde a mulher fez uma lipoaspiração e depois pode se despir na praia pela primeira vez. Elas estão muito felizes consigo mesmas", argumenta Kirchkamp.
É muito ruim ter pessoas indo às praias da Alemanha sorrindo e contentes pessoalmente? Sybille Golkowski acredita que já há outros meios para conquistar este "sorriso de felicidade", assim como é possível sentir-se bem consigo mesmo sem a necessidade de cirurgias.
"Antes de as pessoas entrarem na faca, elas deveriam perguntar a si mesmas se a a pressão por serem bem-sucedidas esteticamente justifica cirurgia. Sabemos que o sucesso ultimamente tem um pouco a ver com a aparência visual."
O "x" da questão
Para Kirchkamp, o real problema das cirurgias estéticas é que lacunas na fiscalização oferecem a oportunidade para "charlatões" ganharem dinheiro com isso.
Isso significa que os únicos médicos autorizados a trabalhar neste mercado são os cirurgiões especialistas em garganta, nariz e ouvido, boca e mandíbula e cirurgiões plásticos especialmente treinados. No caso dos dois primeiros, eles são registrados oficialmente para atuar na área do corpo relativa à sua especialidade.
Mas isso não é controlado, e médicos oportunistas que se autodenominam "cirurgiões plásticos gerais" oferecem serviços que vão de lipoaspirações ao implante de silicone para aumento dos seios.
"Eu sempre digo às pessoas que me pedem conselhos que perguntem ao médico qual é a sua especialidade, se ele é especialista em cirurgia estética, onde estudou e que qualificações possui. As pessoas precisam se informar", alerta Kirchkamp.