Arte russa
28 de julho de 2008A "arte conceitual russa" surgiu nos anos 1960, quando o realismo socialista ainda dominava o cenário das artes plásticas no país. Como uma espécie de mundo paralelo, ela surgiu a partir da iniciativa de um grupo independente de artistas plásticos, fotógrafos e escritores que se manteve coeso até a década de 1990.
A curadoria da exposição sobre esta vertente da arte russa no espaço Schirn Kunsthalle, em Frankfurt, é de Boris Groys, pesquisador russo que hoje vive na Alemanha e que cresceu fazendo parte do grupo de artistas ligados à concept art em seu país. "Foram tempos de um intercâmbio intelectual muito intenso. Todos nós tínhamos a sensação de que estava surgindo uma coisa nova, algo interessante; acreditávamos que estávamos fazendo algo que outros não faziam, que não tinha nada a ver com o dia-a-dia e com a cultura de massa soviética", lembra Groys.
Jogo de imagens e textos
Groys, que hoje é profesor de Filosofia e Teoria da Mídia em Karlsruhe, conheceu nos anos 1960 e 1970 todos os "artistas conceituais" de Moscou, como Ilya Kabakov, Erik Bulatov e Boris Mikhailov, entre outros. Ele participou de performances na periferia das cidades, quando o grupo dependurava cartazes com dizeres grotescos em árvores cobertas de neve, ou quando 30 artistas construíram juntos, usando 12 dúzias de envelopes coloridos, uma obra de arte conjunta.
Groys também esteve presente quando o grupo expôs, longe do olhar controlador das instâncias oficiais, imagens que se distanciavam propositalmente do socialismo realista dominante. Uma arte, como diz o especialista, que conseguiu existir numa espécie de universo paralelo, sem adquirir, no entanto, o caráter de arte dissidente ou de oposição política. Talvez exatamente por isso essa vertente da arte russa chamava pouca atenção da mídia estatal e conseguia raramente espaços para ser exposta.
A arte conceitual de Moscou guiava-se por princípios irônicos, jogando com imagens, fotografias, instalações e, acima de tudo, com textos, que por sua vez serviam de comentários para as imagens expostas. A palavra é, desta forma, parte essencial desta vertente da arte, cujo propósito era intervir no discurso oficial, escancarando seus absurdos e deficiências.
Olhar saudosista
Praticamente todos os membros do grupo de artistas conceituais russos de então ainda estão vivos. Groys, durante os preparativos para a mostra em Frankfurt, fez questão de entrar em contato com muitos deles. As conversas, conta o curador, foram muitas vezes ambíguas, permeadas por um certo saudosismo.
Esse olhar histórico, observa Groys, não é tão relevante diante do fato de que hoje há um mercado de artes interessado em absolver o que foi produzido então: "De repente, aparece muito dinheiro para ser investido na arte contemporânea. Os artistas atuais demonstram uma certa insegurança diante disso, mas ao mesmo tempo projetam grandes esperanças nessa situação".
Hoje, acredita o curador, a pergunta mais crucial é saber qual produção artística pode trazer uma maior continuidade e estabilidade no mercado. "As condições mudaram. Antes era o socialismo, depois veio o capitalismo, é possível que ainda venha outra coisa depois. A arte surge sempre do cruzamento entre as grandes tradições e o presente", analisa Groys.
Expectativa febril
Os pontos de interseção entre o presente e esta arte produzida na Rússia entre os anos 1960 e 1990 guiaram Groys em suas reflexões para a preparação da exposição em Frankfurt. A classe rica russa já descobriu há muito o mercado de artes e, com ele, os artistas conceituais. Algumas obras foram até mesmo adquiridas por colecionadores durante o período de preparação da mostra na Alemanha.
"Percebi uma expectativa febril de que obras que hoje não não muito caras passem talvez a custar milhões daqui a dois anos. Há quadros que nem eram vendíveis há três ou quatro anos atrás e hoje já valem milhões. Ou seja, estamos diante de um desdobramento explosivo", observa o curador Groys.