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Angola: Indulto de João Lourenço é "presente envenenado"

Lusa
10 de janeiro de 2025

Ativistas angolanos colocados em liberdade esta semana dizem que indulto "os obriga a reconhecerem crimes que não cometeram" e garantem que "luta contínua".

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Ativistas angolanos no caso 15+2
Ativistas angolanos dizem que indulto de João Lourenço é "presente envenenado"Foto: privat

Os ativistas Adolfo Campos, Abraão dos Santos, conhecido como "Pensador", Gilson da Silva Moreira "Tanaice Neutro" e Hermenegildo André "Gildo das Ruas", estão em liberdade desde 06 de janeiro, após indulto do Presidente angolano, João Lourenço, a 51 cidadãos em todo o país, no âmbito das comemorações do 50.º aniversário da independência do país.

Em conferência de imprensa, esta sexta-feira (10.01), promovida pelo Friends of Angola (FoA) e o Observatório para Coesão Social e Justiça (OCSJ), organizações cívicas angolanas, os quatro ativistas disseram que a sua detenção e condenação em setembro de 2023 "foi ilegal" e teve "motivações políticas".

Disseram que estiveram "injustamente" privados da liberdade durante um ano, três meses e 21 dias "por vontade do Presidente angolano", referindo que o indulto pretende apenas veicular a mensagem de João Lourenço como "um bom samaritano".

"Presente envenenado"

O indulto presidencial, referiram, é um "presente envenenado na medida em que astuciosamente obriga a reconhecer que foram perdoados e a aceitar inconscientemente crimes não cometidos".

Denunciaram igualmente condições desumanas nas cadeias do país, desde mortes de prisioneiros, tortura física e psicológica, falta de comida, de espaços de acomodação e de condições para a realização de necessidades físicas.

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"Nós estivemos privados de liberdade numa pocilga e não numa cadeia. O que acontece nas cadeias do nosso país é um genocídio", disse Adolfo Campos.

"Na área de infecciologia do Hospital Prisão de São Paulo, onde fui encaminhado por suspeitas de infeção pulmonar, morrem diariamente mais de quatro reclusos", lamentou o ativista, pedindo amnistia geral a todos os reclusos do país.

Afirmando-se "inconformado" com a atual situação social e económica de Angola, Gilson da Silva Moreira assegurou que vai continuar a lutar por revolução e bem-estar dos cidadãos.

O ativista pediu mesmo união dos angolanos em prol de um país mais justo e democrático, disse que o atual problema do país "é a fome" e manifestou disponibilidade para ser cabeça de lista de um partido na oposição, nas eleições gerais de 2027, para "com coragem mudarmos o país".

Ativista Gilson Moreira da Silva
Gilson da Silva Moreira assegurou que vai continuar a lutar por revolução e bem-estar dos cidadãosFoto: Borralho Ndomba/DW

Luta coletiva e contínua, coragem e união dos angolanos foram os apelos do ativista Abraão dos Santos.

Os quatro ativistas reafirmaram que foram presos injustamente e asseguraram que vão prosseguir com todas as ações admitidas nas leis angolanas de modo a fazer prevalecer os seus direitos violados e a reposição da legalidade com uma justiça digna e inclusiva.

O processo que envolveu os ativistas "não foi digno, foi uma montagem política para atacar as vozes críticas e discordantes no país", referiu o advogado e coordenador do OCSJ, Zola Bambi.

"Zenu" renunciou ao indulto

Questionado sobre se iriam seguir o filho do antigo Presidente angolano, José Filomeno dos Santos "Zenu", um dos 51 indultados, que renunciou ao indulto presidencial, Zola Bambi considerou que o ex-presidente do Fundo Soberano de Angola "gozou de certa vantagem porque se encontrava em prisão domiciliar".

"Se eles (os ativistas) tivessem o que lhes foi negado, a liberdade provisória, poderíamos chegar até ao final, mas era preciso sair da cadeia porque não deviam estar aí. Saíram porque se abriu a porta para sair e não porque aceitaram o indulto", justificou.

José Filomeno dos Santos
Numa carta enviada ao Presidente João Lourenço, Zenu considera o indulto, como um "equívoco legal"Foto: Grayling

Numa carta de Zenu enviada ao Presidente angolano João Lourenço, citada pela SIC, este considera o indulto, como um "equívoco legal", uma vez que anula o cumprimento da pena, mas mantém os efeitos da condenação. 

Para o FoA e o OCJS, a prisão dos referidos ativistas, considerados pela sociedade civil e partidos na oposição como "presos políticos", foi "ilegal", tendo-lhes sido negada a liberdade condicional, recursos e a providência de habeas corpus porque a sua soltura "dependia das ordens superiores".

"Razão pela qual, somente foram soltos por força do poder discricionário do titular do poder executivo que, em aproveitamento, promulgou o decreto, esvaziando as competências do poder judicial e os procedimentos legais", refere o comunicado das ONG apresentado no encontro.

Para estas organizações, a prisão dos ativistas visou intimidar a sociedade civil e levantar um clima de medo, salientando que estes não violaram a Constituição e nem o direito de reunião e manifestação.