Alemanha inicia debate sobre regresso de refugiados sírios
11 de dezembro de 2024Poucos dias após o colapso do regime do Presidente Bashar al-Assad na Síria, eclodiu na Alemanha um debate sobre o possível regresso de migrantes sírios e requerentes de asilo ao seu país de origem.
Figuras destacadas da direita, desde o partido conservador da oposição União Democrata-Cristã (CDU) até ao partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD), não tardaram a sugerir planos que incentivam os sírios a regressar a casa.
Já as vozes mais à esquerda do Partido Social-Democrata (SPD) e dos Verdes, os dois partidos que fazem parte da coligação governamental alemã, agora minoritária, advertiram contra ações drásticas.
De acordo com o Ministério do Interior alemão, vivem atualmente na Alemanha 974.136 cidadãos sírios. Cerca de 712.000 receberam o estatuto de refugiado, que inclui os requerentes de asilo com pedidos pendentes e os requerentes de asilo cujos pedidos foram rejeitados, mas a quem foi concedida proteção temporária por razões humanitárias.
A grande maioria chegou à Alemanha entre 2015 e 2016, sob a égide da antiga chanceler Angela Merkel, autora da famosa frase: "Wir schaffen das" ("nós conseguimos"), em resposta à chegada dos sírios ao país.
Na segunda-feira (09.12), o Gabinete de Migração e Refugiados (BAMF) da Alemanha anunciou que iria congelar temporariamente a decisão sobre os pedidos de asilo de cidadãos sírios - tal como fizeram as autoridades da Áustria, Itália, Noruega, Países Baixos, Suíça, França, Bélgica e Reino Unido.
Incentivos para partir
"O fim da tirania brutal do ditador sírio Assad é um grande alívio para muitas pessoas que sofreram tortura, assassínio e terror", afirmou a ministra do Interior da Alemanha, Nancy Faeser (SPD).
"Muitos refugiados que encontraram proteção na Alemanha têm agora finalmente esperança de regressar à sua pátria síria e de reconstruir o seu país", acrescentou.
O ex-ministro da Saúde Jens Spahn, político da CDU (oposição), partido que lidera atualmente as sondagens às eleições antecipadas de fevereiro na Alemanha, interpretou estas palavras como um convite para sugerir incentivos financeiros para que os refugiados sírios deixem a Alemanha.
"Como primeiro passo, eu diria que devemos fazer uma oferta", disse Spahn à emissora RTL/ntv na segunda-feira (09.12). "Que tal o governo alemão declarar: quem quiser voltar para a Síria, nós fretamos aviões e oferecemos-lhes um pagamento inicial de 1.000 euros", sugeriu.
Markus Söder, primeiro-ministro da Baviera e presidente do partido-irmão da CDU, a União Social-Cristã (CSU), também considera que mesmo aos sírios com estatuto de asilo oficialmente reconhecido deveriam ser oferecidos "incentivos" para partirem.
"A Alemanha ofereceu refúgio a muitas pessoas necessitadas", disse Söder ao podcast "Table Briefings", na terça-feira (10.12). "Quando a situação muda e o motivo para o asilo deixa efetivamente de existir, então não há razão legal para permanecer no país", argumentou.
Propostas apoiadas por outros partidos
Os comentários de Markus Söder foram repetidos por Alice Weidel, uma das principais líderes do partido de extrema-direitta AfD. "Para muitos sírios, o motivo para fugir já não existe", disse à revista Stern. "Obviamente, estas pessoas devem regressar imediatamente à sua terra natal", defendeu.
Referindo-se às celebrações de sírios que ocorreram em várias cidades alemãs desde a queda de Assad, Weidel repetiu nas redes sociais: "Qualquer pessoa na Alemanha que celebra a 'Síria livre' evidentemente já não tem qualquer razão para fugir. Devem regressar imediatamente à Síria."
Sahra Wagenknecht, ex-comunista e fundadora do novo partido Aliança Sahra Wagenknecht (BSW), concorda: "Espero que os sírios que festejam a tomada do poder pelos islamitas regressem ao seu país o mais rapidamente possível", disse à revista Stern.
SPD e Verdes apelam à moderação
Outras vozes na Alemanha, no entanto, apelaram à moderação. "Depois de um dia e meio, considero que este é um debate de política interna inadequado", disse à rádio RBB Katrin Göring-Eckardt dos Verdes, em Berlim.
Michael Roth, do SPD, alertou para o facto de ser demasiado cedo para dizer o que o futuro reserva à Síria, após 13 anos de uma guerra civil brutal.
"A situação no terreno continua a ser pouco clara", afirmou Dirk Wiese, também do SPD, criticando os comentários de Jens Spahn, que, a seu ver, "deram a impressão de que o ideal seria ter enviado as pessoas de volta anteontem e pilotado ele próprio o avião."
Joachim Herrmann, da CSU e ministro do Interior do Estado da Baviera, também adoptou uma posição mais moderada. "Aqueles que se integraram bem aqui são convidados a ficar", disse à rádio Deutschlandfunk.
No estado ocidental da Renânia-Palatinado, onde vivem cerca de 50.000 sírios, a ministra da Integração, Katharina Binz, dos Verdes, disse à emissora local SWR que "há muitos [refugiados sírios] que têm filhos na escola, que têm empregos a tempo inteiro e que ficarão assustados quando, de repente, se discutir se terão de deixar o país a qualquer momento - o que é completamente irrealista".
Quanto à situação na Síria, a eurodeputada considera que "ainda não é claro se o país está a ser destruído" e "se os novos governantes se conseguirão impor, como vão tratar as minorias e se vão construir um sistema democrático ou autoritário."
"Conferência internacional sobre a Síria"
O enviado especial do Governo alemão para os acordos de migração, Joachim Stamp, do Partido Liberal (FDP), antigo membro da coligação governamental do chanceler Olaf Scholz, afirmou que a queda de Assad "poderá abrir novas perspectivas de cooperação em matéria de migração". Mas também advertiu que "ainda é muito cedo para começar a planear medidas concretas".
O secretário-geral do FDP, Marco Buschmann, apelou à Alemanha para que convoque uma "conferência internacional sobre a Síria", disse em declarações aos jornais do grupo Funke. "Para muitas pessoas que fugiram para cá, isso pode abrir a possibilidade de regressar a casa", concluiu.
Numa conversa telefónica com o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, disse que a queda de Assad é um "desenvolvimento positivo", afirmou o porta-voz do governo alemão. Segundo Steffen Hebestreit, o objetivo agora é tornar a Síria segura para todos os cidadãos. Os dois países também concordaram que a soberania da Síria deve ser respeitada.